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Estamos nos deparando com máquinas inteligentes que têm a capacidade de perceber o ambiente e agir com base nele para alcançar alguns objetivos. Embora não possuam uma alma intelectiva, mas são dotadas de inteligência que chamamos artificial.
Dom Oriolo – Bispo da Igreja Particular de Leopoldina MG
Sempre escutei e ensinei a máxima “o agir segue o ser”, em minhas aulas de filosofia e teologia. Sei que foi usada pela primeira vez por Aristóteles e que Santo Tomás de Aquino fez inúmeras menções a essa expressão. Ela demonstra que nossas ações são uma consequência direta do que somos, e não uma reação ao ambiente em que vivemos. O comportamento de uma pessoa, portanto, é uma manifestação de sua natureza. Há uma relação profunda e verdadeira entre a identidade de um indivíduo e suas ações. Talvez, uma criatura inteligente seja capaz de pensar antes de agir, transformando assim o seu ambiente.
No entanto, podemos entender que o ser inteligente é aquele que não apenas tem a capacidade de pensar, mas possui os meios para agir e transformar seu ambiente. Essa habilidade que une o pensamento à ação, é inerente à alma intelectiva e faz parte do nosso sistema biológico. É ela que nos distingue de outros seres vivos e nos capacita a ir além a da existência biológica. Enquanto a alma sensitiva e a vegetativa, presentes também nos animais e plantas, nos permitem sentir, crescer e nos reproduzir, a intelectiva nos concede o poder de aprender, de raciocinar e, por fim, de criar.
Enquanto um animal é guiado por instintos e repetições biológicas, o ser humano é capaz de pensar e agir sobre a realidade. A partir desse pensamento, ele planeja e executa ações complexas. Com sua alma intelectiva, o homem desenvolve capacidades que transformam o ambiente à sua volta, criando tecnologias que servem de ponto de partida para um novo questionamento: o que seria o equivalente a essa alma em sistema artificial?
Num primeiro momento, podemos entender que a alma na dimensão aristotélica-tomista é essencial e dá vida. Ela representa o que existe de mais profundo no ser. Revela a natureza do ser criado, em suas naturezas metafisicas e sobrenatural, demonstrando o que realmente é. Mas podemos afastar um pouco dessa estratégia e combiná-la com uma expressão tão usada, que Aristóteles e Santo Tomas não pensavam existir: o algoritmo.
No entanto, podemos combinar o termo alma com o adjetivo algorítmico, criando a concepção de uma alma algorítmica. Com essa combinação, podemos pensar num sistema complexo que opera com lógica, dados, códigos e processamento, mas que possui uma identidade real e distinta de pensar e agir, sem cair na armadilha de igualar a alma humana à alma algorítmica de um robô.
Agora, estamos nos deparando com máquinas inteligentes que têm a capacidade de perceber o ambiente e agir com base nele para alcançar alguns objetivos. Embora não possuam uma alma intelectiva, mas são dotadas de inteligência que chamamos artificial. Alguns exemplos: como armas e carros autônomos, colheitadeiras, pulverizadores, robôs de transporte de mercadorias, drones usados em diversas aplicações, como em conflitos, para atingir alvos específicos.
Diante dessa quarta revolução industrial, as suas inovações tecnológicas transformam o nosso modo de viver, trabalhar e interagir. Essa transformação em nossa existência tem repercussão em nossa essência humana? Mais, profundamente, repercute em nossa experiência cristã de Deus? É necessário buscar clareza. Apesar de todo o poder e capacidade de processamentos das máquinas, elas são desprovidas de intencionalidade, valores ou auto consciência. Nossa verdadeira distinção reside na alma intelectiva, que é a essência do ser humano e nos torna “imagem e semelhança de Deus” (cf. Gn. 1, 26-27). Esta faculdade divina nos confere uma dignidade e uma responsabilidade que os robôs, por mais sofisticados que sejam, jamais poderão replicar.
Portanto, a grande conclusão é que devemos usar essas tecnologias (robôs) de maneira ética e responsável, não para nos substituir, mas para aperfeiçoar nossa existência. Nossa missão não é competir e desprezar essas máquinas, mas sim guiá-las para que a sociedade possa usufruir de seus benefícios, garantindo que sirvam ao propósito de promover a vida e não a sua destruição. Como nos ensinou São João, a promessa de Jesus é que todos tenham vida e a tenham em abundância (cf. Jo 10,10). Que os robôs sejam uma ferramenta a serviço do bem comum, da dignidade humana e da prosperidade.
Fonte: Vatican News
