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Juíza em SC não é escolhida desembargadora após filho de governador acionar polícia contra ela

Doze policiais militares, alguns do pelotão tático, e cerca de oito viaturas foram deslocados para a casa da juíza Margani de Mello em Florianópolis, na madrugada de 27 de setembro. Um mês e oito dias depois, ela não conseguiu a votação necessária no Tribunal de Justiça de Santa Catarina para se tornar desembargadora.

O caso aconteceu após Filipe Mello, filho do governador do estado, Jorginho Mello (PL), denunciar a magistrada por perturbação do sossego. Ele mora no andar acima do dela, num edifício da avenida Beira-Mar Norte, em Florianópolis.

Procurado por meio de sua assessoria, o governador não se manifestou. Filipe Mello não respondeu às mensagens enviadas pela reportagem, e o escritório de advocacia dele também não se pronunciou.

Nove dias depois do incidente, no dia 6 de outubro, o comandante-geral da Polícia Militar do estado, coronel Emerson Fernandes, enviou um ofício ao corregedor-geral do Tribunal de Justiça de Santa Catarina com a notícia dos fatos.

Com base nesse documento, que está sem sigilo, o corregedor-geral do TJ, Luiz Antônio Zanini Fornerolli, recomendou que os demais desembargadores não votassem na juíza para a promoção a desembargadora e propôs outros três nomes para a lista tríplice a partir da qual seria escolhido o ocupante do cargo.

Margani teve o voto de apenas 17 de um total de 79 desembargadores.

Questionada sobre o motivo do envio do ofício ao tribunal, a PM respondeu em nota que “busca sempre o bom relacionamento institucional e, desta forma, a instituição não irá se manifestar sobre a questão proposta, por entender que já comunicou de forma oficial à instituição responsável”.

Então candidata à promoção à desembargadora pelo critério de merecimento, Margani disse ter sido surpreendida na sessão de 5 de novembro do tribunal, ao saber que havia sido excluída da lista tríplice e que havia sido aberta uma apuração sobre episódio ocorrido no prédio.

Na ocasião, Fornerolli afirmou que ela teria que se explicar sobre duas possíveis infrações disciplinares ligadas ao ocorrido.

A primeira seria perturbação do sossego “e, após o acionamento da PMSC [Polícia Militar de Santa Catarina], não adotar as providências para a cessão dos ruídos”.

A segunda seria “utilizar-se do prestígio do cargo para tentar obter vantagem ilícita com a finalidade exclusivamente particular e destituída de interesse público, consistente na tentativa de constranger e coagir os policiais que atendiam a ocorrência”.

Margani afirma que teve os direitos a defesa e a manifestação prévia negados. O prazo para que ela se defenda de eventual processo administrativo ainda está em vigor, mas a decisão que barrou sua promoção já foi tomada.

“Entendo que a doutora pode, sim, figurar e ser votada em homenagem ao princípio de presunção da inocência. Se nós a excluirmos, estaremos já fazendo o julgamento de algo que é ainda incipiente e pode ser resolvido em favor dela”, disse o desembargador João Henrique Blasi, que votou contra a exclusão de Margani da lista tríplice.

A juíza conta que chegou em casa por volta de 0h30 daquela noite de setembro, acompanhada do marido —Ghesler Cavalcanti Soares, que também é servidor do judiciário— e de outros três casais. “Foi ligado o som ambiente na sala, onde conversávamos. Todas as portas estavam fechadas”, diz. A sindicância que deu origem ao relatório da Corregedoria, no entanto, diz que eram mais de dez convidados e que a emissão de som estava em “volume excessivo”.

Em seguida, o interfone teria tocado. “Me parece que era o porteiro, mas não sei dizer. Daí em diante, quem lidou com a situação foi meu marido. Em seguida chegou a PM.” De acordo com a polícia, o vizinho, filho do governador, acionou antes o porteiro e o síndico. Mas, devido à suposta recusa em diminuir o volume, Filipe desceu até a calçada, segundo o relatório, e acionou policiais que faziam patrulhamento na região.

A conversa com os policiais foi conduzida pelo marido dela e um dos convidados. “Ele [o marido] disse que não iria baixar o som, que já estava baixo. Eu já tinha baixado e depois desliguei”, diz a juíza. “O que mais chama atenção é que na sequência chegaram várias viaturas.”

Durante a leitura do relatório, o corregedor-geral do TJ-SC, desembargador Luiz Antônio Zanini Fornerolli, defendeu o procedimento policial como padrão.

A sindicância afirma que Margani se alterou ao falar com os policiais. “Tanto em razão das bebidas alcoólicas ingeridas, como pelo tom elevado da voz e o teor das palavras proferidas. A juíza teria evocado […] o fato de ser desembargadora para fazer com que os agentes de segurança fossem embora de seu apartamento”, diz o documento. A juíza nega ter exposto o cargo, inclusive para se preservar do que aconteceu.

“Não é verdade”, diz sobre a alegação de apontar com o dedo em riste para policiais. “Apontei o braço para o corredor e pedi que resolvessem o que tinham para resolver fora da minha residência porque não tinham mandado.”

A juíza diz desconhecer razões para Filipe ou o governo de seu pai quererem prejudicar a promoção dela. Nesta segunda-feira (10), a juíza, o marido dela e o filho do governador se reuniram e extinguiram por meio de acordo o termo circunstanciado (registro de infrações de menor potencial ofensivo) que havia sido registrado na ocasião. “O encontro foi marcado pelo respeito mútuo e pelo espírito de conciliação”, diz nota.


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