
As defesas de mais quatro réus do chamado núcleo militar da trama golpista negaram à Primeira Turma do STF (Supremo Tribunal Federal) que eles tenham participado do plano de assassinato do ministro Alexandre de Moraes e do presidente Lula (PT).
O julgamento começou na última terça (11), quando o colegiado ouviu os advogados de seis acusados, além da manifestação da PGR (Procuradoria-Geral da República).
A maioria dos denunciados pela PGR nesse núcleo é composta por oficiais do Exército com formação em forças especiais —os chamados “kids pretos”. A previsão é que os ministros exponham seu voto no caso na próxima semana.
O primeiro a se manifestar nesta quarta foi Jeffrey Chiquini, advogado do tenente-coronel Rodrigo Bezerra de Azevedo, único réu a acompanhar pessoalmente as sessões de julgamento.
Ele está preso há 11 meses, acusado de fazer parte de uma operação clandestina para o assassinato de Moraes, que ocorreria em Brasília, no dia 15 de dezembro de 2022:
A Polícia Federal diz ter identificado dois dos seis integrantes do grupo que teria atuado nesse plano. Azevedo, que utilizaria o codinome Brasil, seria um deles.
Documentos apresentados pela defesa do militar e outros obtidos pela Folha mostram que ele trabalhou no quartel em Goiânia durante a manhã e a tarde de 15 de dezembro.
A principal prova de acusação é que um dos celulares empregados no plano contra Moraes foi utilizado por Azevedo duas semanas após a operação fracassada.
“Ele colocou o chip em um celular que teria sido utilizado 14 dias depois do fato, um celular que teria sido usado em uma ação clandestina. Há algo mais tem contra ele? Não”, disse o advogado.
“Tudo que tem é: dia 15 de dezembro de 2022 houve uma ação clandestina de monitoramento da residência do ministro Alexandre de Moraes. Catorze dias depois, o celular dá conexão próxima à residência do Azevedo, e um chip com o CPF dele é colocado nesse celular. E esse celular é usado por seis meses. Então um força especial colocou o seu CPF em um celular usado em uma ação clandestina por seis meses?”, afirmou Chiquini.
Azevedo colocou um chip com seu próprio nome, em 29 de dezembro de 2022, em um dos celulares usados na operação militar clandestina de duas semanas antes.
O militar diz ter pegado o aparelho de uma caixa cheia de telefones no depósito do CCOP (Centro de Coordenação de Operações), no quartel em Goiânia, às vésperas do Natal.
Durante a sustentação oral, Chiquini afirmou que o delegado da Polícia Federal responsável pela investigação mentiu, que a peça da PGR é a pior da história brasileira e que, por já ter atuado em tribunal do júri, poderia avaliar a qualidade da acusação.
Ao encerrar, Flávio Dino, presidente da Primeira Turma, afirmou que a corte tem um histórico de respeito à advocacia e pediu tratamento semelhante. O ministro também mencionou o poder de polícia da presidência.
“O tribunal é destinatário também de respeito, e isso vale também para esta tribuna, que não é parlamentar, não é do tribunal do júri. E isso se chama lealdade. O tribunal tem sido extremamente leal com a advocacia brasileira. Portanto, reivindicamos idêntico tratamento, não só nessa tribuna como fora dela”, disse Dino.
“Faço essa observação no exercício do poder de polícia que cabe a esta presidência. Precisamos manter o julgamento nesses termos, sem prejuízo de outras providências e outros momentos”, concluiu.
Na sequência, o tenente-coronel por Ronald Ferreira de Araujo Junior foi defendido por Lissandro Sampaio e João Carlos Dalmagro Junior.
Nas alegações finais do caso, a PGR pediu que a acusação contra o militar fosse rebaixada e que ele respondesse somente por incitação ao crime e não pelos cinco tipos penais dos quais são acusados os demais. Além disso, Gonet sugeriu que ele tivesse a faculdade de negociar benefícios penais pertinentes.
A justificativa é que o militar espalhou informações falsas sobre fraudes no processo eleitoral para incitar as Forças Armadas à ruptura democrática, mas não participou de reuniões da trama golpista.
“Ele não é um ‘kid preto’. Nunca foi. Ele não teve nenhuma participação nesses eventos. Nas alegações finais reconheceu-se que não foram reunidos elementos adicionais sobre a participação do réu na organização criminosa”, disse Sampaio.
Igor Laboissieri, advogado do tenente-coronel da reserva Sérgio Ricardo Cavaliere, disse que o fato de seu cliente ter, segundo a denúncia, encaminhado texto apócrifo de tom golpista aos seus comandantes não significa que ele concordasse com o seu teor ou tivesse participado do seu planejamento.
A missiva foi divulgada na internet em 29 de novembro de 2022. Sob o título “carta dos oficiais da ativa ao Comando do Exército”, buscava pressionar o então comandante da Força, Marco Antonio Freire Gomes, a apoiar um golpe militar.
“Os próprios superiores hierárquicos dele falam que nunca foram pressionados e que nunca viram Cavaliere tentar pressionar ou convencer nenhum militar. A transmissão não configura o protagonismo de modo algum”, disse Laboissieri. “Ele não produz, não confecciona, ele não assina a carta publicada”, disse.
O advogado disse também que o cliente não é um “kid preto” e, sem essa vinculação, a acusação fica enfraquecida.
O último a se manifestar foi Sergio William Lima dos Anjos, pela defesa do policial federal Wladimir Matos Soares. Parte central da tese defensiva foi o isolamento do réu em relação aos demais implicados no caso. Segundo ele, a denúncia é falha, fragmentária e não há individualização das condutas.
A acusação afirma que Wladimir era responsável por monitoramentos, mas a defesa rebate dizendo que o policial não tinha contato com os demais réus.
“É um policial federal. Não é um ‘kid preto’. Não existe qualquer liame de indício de presença de Wladimir. Nenhum dos réus o conhecia. Nenhuma das testemunhas o conhecia. Ao analisar o processo, a peça acusatória ficou com esse questionamento. Ao analisar os depoimentos do delator, não há qualquer menção.”
Segundo a Polícia Federal, Wladimir repassou informações sobre a segurança do presidente Lula (PT) durante a transição de governo para pessoas ligadas a Jair Bolsonaro (PL).
Ainda de acordo com a investigação, ele afirmou a aliados de Bolsonaro que estava à espera da “canetada” do então presidente para auxiliar no golpe de Estado.
Em áudio, ele afirma que um grupo armado do qual fazia parte estava pronto para dar um golpe de Estado assim que o então presidente Bolsonaro assinasse um decreto intervindo contra o resultado das eleições presidenciais.
“Eu estive lá também, né, Lu, eu posso falar para você aqui no privado, morre aqui, eu fiz, eu ia, nós fazíamos parte, fazemos, né, de uma equipe de operações especiais que estava pronta para defender o presidente armado, sabe, e com poder de fogo elevado para empurrar quem viesse à frente”, diz o policial.
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