
José Joaquim Cabral, autor de diversas obras, considera que a sua escrita foi abençoada por Frei Gesualdo Fiorini, sobre cuja marcante vida, em São Nicolau, escreveu uma biografia em 2006. Não tinha experiência, mas deu certo e continuou. Ele veio à Itália para encontros literários na Universidade de Roma e homenagem na comunidade cabo-verdiana e em Fiuggi a esse distinto capuchinho italiano que dedicou 52 anos da sua vida ao desenvolvimento espiritual e material de Cabo Verde.
Dulce Araújo – Vatican News
Numa cornija múltipla – que contemplou um encontro na comunidade cabo-verdiana para homenagear os 70 anos da chegada dos Frades Capuchinhos à ilha cabo-verdiana de São Nicolau (um deles Frei Gesualdo Fiorini que tanto marcou a ilha) uma ida a Fiuggi, terra natal do referido frade, e encontros literários na Universidade de Roma, La Sapienza – a estada de José Joaquim Cabral em Itália de 2 a 6 de novembro 2025, foi um importante momento de partilha do seu percurso literário e dos projetos de investigação que tem em curso.
Frei Gesualdo Fiorini, italiano de São Nicolau, Cidadão.
Tudo começou em 2006 com a escrita duma biografia sobre a vida e ação do P. Gesualdo Fiorini na ilha de São Nicolau, pessoa que José J. Cabral tinha muito a peito, mas cuja filosofia de desenvolvimento espiritual e material adotada em São Nicolau, onde o frade chegou em 1955, viveu 52 anos e está sepultado, não era bem compreendida nem por uma certa camada da população, nem pelos seus próprios superiores. José Cabral sentiu que havia algum equívoco, que devia ser esclarecido, e hoje acredita que essa biografia tenha contribuído para isso.
A minha escrita foi abençoada pelo P. Gesualdo
Além disso, foi um estímulo para José J. Cabral enveredar-se pelos caminhos da escrita e investigação histórica, com um olhar particular para a ilha de São Nicolau (donde é natural). Dá, então, continuidade à linha de “Chiquinho”, publicado em 1947 por Baltazar Lopes. Nesse romance, considerado o primeiro da literatura cabo-verdiana, o homem cabo-verdiano emerge – segundo Cabral – pela primeira vez e com a sua própria forma de falar português. O romance termina com Chiquinho a emigrar, em 1930, para os Estados Unidos. Baltazar queria ir para lá acompanhar a sua vida e prosseguir na escrita. A polícia portuguesa não deixou. Acushnet Avenue e Destinho Aziago são as duas obras duma trilogia de Cabral nas pegadas de Chiquinho e através desse personagem abarcam os dissabores de Baltazar tanto com o regime colonial, como pós-colonial.
Pelas lides da escrita e da investigação
José Joaquim Cabral continua nas lides da escrita e da investigação e está atualmente envolvido em trabalhos relacionados com as Baleias no contexto do Museu das Pescas de Cabo Verde; com os poucos conhecidos campos de concentração, criados pelo regime do Estado Novo português, em 1931, na Ilha de São Nicolau (antes da famosa prisão do Tarrafal de Santiago); e com a transferência temporânea do Bispado de Cabo Verde da Cidade Velha (ilha de Santiago) para São Nicolau (1885-1943); entre outros.
Para conhecer melhor o percurso de José Joaquim Cabral, leia a crónica de Filinto Elísio (Rosa de Porcelana Editora) e ouça as suas palavras na emissão “África em Clave Cultural: personagens e eventos” do dia 6/11/2025
Crónica
José Joaquim Cabral – a Diáspora como História e Identidade
José Joaquim Cabral faz parte de uma nova geração de investigadores e escritores cabo-verdianos, muito ligados às questões da História e Identidade, bem como à Diáspora, uma das marcas da nação cabo-verdiana.
No passado mês de julho, integrou um grupo de quatro escritores lusófonos (dois de Moçambique e uma de Portugal) contemplados com Bolsas de Criação Literária 2025 do Instituto Internacional de Língua Portuguesa, IILP, no âmbito da 2ª edição do seu Programa de Residências de Criação Literária.
A esta bolsa do IILP, o escritor cabo-verdiano desenvolveu pesquisas em Braga, Portugal, para um romance em preparação, com a trama ambientada na ilha de São Nicolau, nos anos trinta do século passado, aquando do encerramento do Seminário-Liceu, da chegada dos primeiros deportados do Estado Novo, ligados à Revolta da Madeira, e da vivência de dois sacerdotes portugueses na ilha.
José Joaquim Cabral nasceu em 1962 na ilha de São Nicolau. Depois de concluir os estudos liceais na cidade do Mindelo, em São Vicente. Formou-se em Administração de Empresas, em 1990, no Brasil.
Foi quadro do Instituto Nacional do Desenvolvimento das Pescas, exerceu funções de direção no Instituto Nacional de Estatística, ocupando-se com questões de planeamento, ambiente e desenvolvimento no município de Tarrafal de São Nicolau. Atualmente exerce funções no Conselho de Administração da Escola do Mar. Passou ainda pelo Gabinete do Ministro do Mar, onde foi assessor. Atualmente, José Joaquim Cabral exerce funções no conselho de administração da Escola do Mar.
Em 2022, foi distinguido “por unanimidade do júri”, com o romance “Destino Aziago”, pela 4ª edição do Prémio Literário Arnaldo França, atribuído pela Imprensa Nacional-Casa da Moeda, com a Imprensa Nacional de Cabo Verde. Concorrera com o pseudónimo de Beto Zabel. À Voz da América, ele afirmaria que “mais que um prémio individual, é coletivo, e um tributo à terra de grandes escritores, e honrado por dar continuidade à ‘Chiquinhagem’ que Baltasar Lopes da Silva não pôde realizar”.
Na verdade, esse romance abordava a vivência da diáspora cabo-verdiana, com uma escrita dialogante com a última parte do emblemático romance “Chiquinho”, de Baltasar Lopes, publicado em 1947.
José Joaquim Cabral já publicara, em 2019, o romance “Acushnet Avenue”, em 2014, o romance histórico “Caminho(s) que trilharam”, os livros “Sodade de Nhâ Terra Saninclau” I, II, III (em 2008, 2009 e 2012) e a biografia “Padre Gesualdo Fiorini, Italiano, de São Nicolau, cidadão” (em 2006).
A par de escritor, ele integra o Conselho Científico co Museu da Pesca de Cabo Verde, é membro do Comité Consultivo Cabo-verdiano do Museu da Baleia de New Bedford – USA e faz parte da Sociedade Cabo-verdiana de Autores. Colaborou em projetos audiovisuais como O Velho Caminheiro, documentário realizado por Jean Gomes, em 2014 e Cabo Verde: uma História Submersa, documentário realizado por Emmanuel C. d’Oliveira, em 2017.
Fonte: Vatican News




