
Do escândalo se fez o silêncio. Depois, multiplicação. Por fim, resignação. Surdas à indignação popular, instituições se escondem no armário.
Reportagens recentes trouxeram novidades sobre o instituto que André Mendonça abriu com ex-ministro bolsonarista em 2024. Weslley Galzo, do Estadão, publicou: “Instituto de Mendonça fatura R$ 4,8 mi em contratos públicos em pouco mais de um ano”; “Mendonça relata ações de interesse da Fiesp e mantém convênio com a federação por meio de instituto”.
Eduardo Militão, do UOL, noticiou: “Mendonça suspende julgamento de governador após RR contratar seu instituto”. Soubemos também que, ameaçada de perder status de “filantrópica” por suspeita de remuneração ilegal de dirigentes, a Fundação Faculdade de Medicina incluiu Mendonça em seu conselho.
O que Fiesp, governador de Roraima e fundação privada têm em comum? Profunda simpatia por André Mendonça.
Há leis que se aplicam a você, juiz e juíza das instâncias inferiores, não a ministros do STF. Ministros do STF podem ignorar Código de Ética, vocês não. Podem falar pelos poros e articular pelos corredores de Lisboa e Buenos Aires, vocês não. Podem dar de ombros a controle, vocês não. Podem viajar com patrocínio, vocês não.
Podem usar de seu cargo para beneficiar parentes. Para vocês, juízes, costuma ser mais difícil, menos rentável. Podem ser empresários e usar sua imagem pública nos negócios. Vocês não têm capital político nem imagem pública. Nem deveriam ter.
Ministros do STF podem. Difícil imaginar o que não podem. E quem pode dizer, com autoridade, que não podem. Difícil saber a quem respeitam. Em defesa da instituição do STF, o comportamento de ministros do STF precisa ser interpelado. Não temos por onde.
O pioneiro do empreendedorismo magistocrático de escala foi Gilmar Mendes. A CBF Academy foi sua última inovação. André Mendonça resolveu peregrinar nessa avenida dos negócios e virar ministro-empresário.
Diz a Constituição: “aos juízes é vedado exercer outro cargo ou função, salvo uma de magistério”. Mas magistocratas apelam a explicação marota: Lei Orgânica da Magistratura (Loman), de 1979, permite a juiz ser “acionista”.
Mesmo supondo que a regra da Loman seja constitucional, que a Constituição não tenha dito o que disse, ainda seria ilegal. Na prática, ministros citados não são apenas acionistas. Alguém que lidera iniciativas públicas da empresa e se presta a garoto-propaganda para venda de serviços, toma decisões e fala em nome dela, não é só acionista. Se a prática não corresponde ao escrito no contrato social, predomina, para a lei, a prática.
Da ilegalidade grosseira se fez legalidade alternativa. Há toda uma carteira de legalidades alternativas abertas ao investimento magistocrático. Um portfólio rentável fora do alcance da Faria Lima. Fazer-se empresário é uma. Mas não vá sair por aí e contar à besta extremista. Ele invoca qualquer pretexto para justificar o plano de fechar esse tribunal que superestima sua reputação.
No metaverso magistocrático, nada disso corrompe a integridade do ato de julgar. Lei que bate em juiz de primeira instância não bate em ministro. Lei que bate em cliente pobre da defensoria não bate em cliente rico da advocacia.
Mas pau que não bate em Mendes não bate em Mendonça. Pela igualdade das prerrogativas e isonomia dos privilégios.
LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar sete acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.
Veja mais em Folha de S. Paulo



