
O padre Vilson Groh, que há mais de 40 anos trabalha no combate à pobreza em comunidades carentes, e Edwin Costa, coordenador do encontro “Com Deus Tem Jeito”, comentam a publicação da exortação apostólica Dilexi te. Eles praticam o serviço aos pobres como expressão da fé, colocado em evidência no primeiro documento do Papa Leão XIV.
“A condição dos pobres representa um grito que, na história da humanidade, interpela constantemente a nossa vida, as nossas sociedades, os sistemas políticos e económicos e, sobretudo, a Igreja. No rosto ferido dos pobres encontramos impresso o sofrimento dos inocentes e, portanto, o próprio sofrimento de Cristo”. Esse trecho, logo no início da exortação apostólica Dilexi te, publicada pelo Papa Leão XIV na quinta-feira (9/10), explica em poucas palavras a importância do amor pelos despossuídos e a sua relação com o Evangelho, no qual esse tema se tornará um central.
Por consequência, tanto a história da Igreja Católica quanto a sua atualidade são repletas de exemplos de pessoas que fizeram a opção pelo serviço aos mais pobres. Para eles, essa exortação apostólica é recebida de maneira especial, não apenas por ser o primeiro documento do novo Papa. “É um documento extremamente importante, um documento que pauta novamente a necessidade e a importância da igreja em saída”, comenta o padre Vilson Groh, que há mais de 40 anos fez ele próprio a escolha de andar ao encontro dos mais vulneráveis. Em 1979, quando tinha 22 anos, ele se mudou para o Morro do Mocotó, comunidade carente próxima ao centro de Florianópolis. Foi o início de um trabalho social que hoje se materializa no Instituto Pe. Vilson Groh (IVG), centro de uma rede com outras seis organizações, que juntas alcançaram 19 mil pessoas no ano de 2024.
Padre Vilson destaca a continuidade entre a Dilexi te e o último documento produzido pelo Papa Francisco, a Exortação Apostólica Dilexi nos, que fala sobre o amor de Jesus Cristo. “Traz de novo a centralidade da compreensão dos pobres na visão do Evangelho. Isso tem uma consistência muito grande, da relação do amor a Cristo e do amor ao pobre”, explica o padre, que continua: “não há como amar se a gente não recuperar o olhar, no processo bíblico, do cuidado com os doentes, com os pobres, com os abandonados, os injustiçados, os imigrantes e todos aqueles que são destituídos de direitos, da dignidade humana. Esse olhar é um olhar de Deus, que passa pelo olhar do coração”.
Essa dimensão histórica da presença da Igreja Católica junto aos pobres é outro elemento do documento destacado por Padre Vilson. “Ele traça um pouco esse caminho da presença da igreja junto aos pobres, da presença da igreja também na América Latina, em relação aos documentos latino-americanos como Medelín, Puebla, Santo Domingo e Aparecida”, diz Vilson, que também menciona essas conferências episcopais como inspirações para o trabalho social que realiza.
O documento de Leão XIV reafirma a necessidade do contato com os mais pobres e do poder transformador que essa experiência proporciona, algo compartilhado por Groh. “Penso que o evangelho nos ensina a aprender a partir dos pobres, aprender a sua solidariedade, aprender a partilha, aprender a dimensão da provisoriedade, que vivem na prática do dia a dia, que é a luta pela sobrevivência. Aprender a partir daí a presença do Cristo crucificado que nos abre o caminho para construir processos na relação com a ressurreição”, afirma.
Gerar uma experiência pessoal por meio do serviço aos destituídos é um dos principais objetivos do trabalho social de Edwin Costa. “Quando nós fazemos uma experiência pessoal com Jesus abandonado, crucificado, aqueles irmãos que mais sofrem, é impossível ficar indiferente a essa presença. Nós somos impelidos a amar”, declara o coordenador da Obra Lumen e do encontro “Com Deus Tem Jeito”, este último uma comunhão de cerca de 500 expressões eclesiais que já resgatou mais de 7.500 pessoas em situação de rua. Para ele, fazer os outros felizes nos deixa felizes, porque “amamos gratuitamente, porque amamos incondicionalmente, exatamente da forma que Deus ama. É isso que a primeira exortação apostólica do Papa Leão nos diz”.
Para Costa, o documento do Papa Leão se torna um grande incentivo ao seu trabalho, quando encoraja as pessoas a abandonarem o egoísmo “para ir ao encontro dos pobres, especialmente para fazer uma experiência pessoal com Jesus abandonado, com Jesus crucificado, como uma resposta para as dores da humanidade”. Como modo de romper a indiferença e atrair as pessoas para essa missão, Edwin Costa propõe uma linguagem alegre e um testemunho vivo. “Nunca uma linguagem de julgamento ou de condenação, porque essa linguagem muitas vezes pode afastar ainda mais as pessoas dessa realidade. Mas um convite muito alegre, muito feliz de quem de fato vive a experiência de ser feliz fazendo outro feliz”, recomenda.
Ele acredita que a exortação apostólica Dilexi te nos convida a ouvir o clamor dos pobres e a quebrar nossas barreiras de preconceitos, para entender o que essas pessoas passam. “Entendendo o que ele vive, entendendo as suas dores, os seus sofrimentos e ofertando uma resposta de amor”, pontua, para completar: “Nós podemos, portanto, ofertar nesse momento os sacramentos, uma sincera experiência com o amor de Deus, com a misericórdia de Deus e um caminho de transformação, assim como também de socorro através de oportunidades de profissionalização, de dignidade, de amor, de inserção, de reinserção no mercado de trabalho e tantas outras alternativas de uma vida mais digna, fraterna e feliz”.
Fonte: Vatican News


