
A Praça São Pedro, no Colonato de Bernini, recebe uma exposição com mais de 130 presépios de artistas de 23 países, dentre eles, o Brasil. Direto do Rio de Janeiro, a obra leva ao coração da Igreja a sustentabilidade e a identidade brasileira. Uma mistura de simplicidade, criatividade e singeleza compõe a arte criada pelas mãos de Tia Eva, uma artesã fluminense de Cabo Frio
Mariane Rodrigues – Cidade do Vaticano
As fibras de taboa, bananeira, palha de milho e até de coco da Região dos Lagos, no Rio de Janeiro, foram parar no Vaticano após um trabalho minucioso desenvolvido pelas mãos da artesã Tia Eva, que criou um presépio especial à base de materiais de origem vegetal com características brasileiras e agora está exposto no Colonato de Benini, à vista do mundo inteiro. Ao lado de um quadro feito pelas mãos do artista Marcos Martins com base em plástico triturado recolhido do oceano e a imagem do Cristo Redentor, a Natividade faz parte da exposição “100 Presépios no Vaticano”.
A exposição, organizada pelo Dicastério para a Evangelização, foi aberta nessa segunda-feira, 8 de dezembro, e seguirá até o dia 6 de janeiro de 2026, quando se encerra o Jubileu 2025 e se celebra o dia de Reis. São exatamente 132 presépios de 23 países do mundo, incluindo o Brasil, expostos ao público, de forma gratuita, sem necessidade de reserva para a visitação. As obras estão alocadas na parte esquerda da Praça São Pedro.
Quando o simples e o divino se cruzam
Tia Eva – como é conhecida a fluminense de Cabo Frio Eva Gomes – é uma artesã, mas antes de tudo, uma fiel. Antes de cada obra preparada por ela com esmero, é feita uma oração para que as suas mãos sejam guiadas pelas graças de Cristo.
Assim como Cristo, que veio ao mundo de forma simples, dentro de um estábulo e em meio a uma família humilde de Nazaré, ela descreve que o seu presépio também é uma obra “humilde”, mas que o simples e o divino se cruzam, alcançando lugares longínquos.
“É a coroação de uma vida inteira dedicada a transformar fibras simples em algo que toca as pessoas. Ver um material tão humilde chegar tão longe mostra que o ‘simples e divino’, como sempre digo, podem alcançar lugares que meus olhos aqui no Brasil talvez jamais alcançassem”, expressou a artista, afirmando estar feliz por ver um trabalho executado com “a terra, com a natureza” e com a tradição de seu lugar, ser levado para o Vaticano.
O Presépio de Tia Eva preserva técnicas tradicionais da Família Gomes, mantendo o mesmo modo de produção desde a década de 1970.
A obra de Tia Eva foi levada para a exposição “100 Presépios no Vaticano” pelo Santuário Arquidiocesano Cristo Redentor, por meio do Consórcio Cristo Sustentável e proposição do Instituto Redemptor, que atua na promoção de campanhas sociais e de sustentabilidade junto à Igreja.
Esta é a segunda vez que o Santuário leva um presépio à exposição vaticana, representando o Brasil. O tema deste ano é “A casa comum: O Redentor que Cuida”, fazendo referência à Carta Encíclica Laudato Si’ do Papa Francisco, que aborda os aspectos sociais e ambientais do planeta.
Assim, o Santuário transporta para o Vaticano uma obra que representa o nascimento de Cristo, por meio de materiais provindos da natureza brasileira e com a identidade cultural e religiosa do país: a imagem do Cristo Redentor.
“Esse ano a gente fez uma reedição com um presépio um pouco menor, mas mais detalhado, com mais materiais, mais fibras. Então, a tia Eva usou e abusou dessas técnicas, utilizando folhas de bananeira, folha de milho. Tem mais texturas, mais detalhes e as imagens estão mais trabalhadas. O presépio do ano passado era maior, porém com outra técnica. Então, posso dizer que este está mais acolhedor, traz muita simplicidade e eu acho que é esse o mistério”, destacou o diretor de Marketing do Santuário Carlos Lins, que está no Vaticano e participou da montagem do presépio.
Lins comenta sobre a reação dos visitantes no primeiro dia da exposição, especialmente ao perceber a imagem do Cristo Redentor. “A imagem do Cristo Retendor abençoa toda a cena. Chama muita atenção. É bonito ver os turistas se questionando: ‘Por que tem um Cristo Redentor no nascimento de Cristo’. Em seguida eles leem: ‘Ah, Rio de Janeiro, Brasil’, aí é uma festa”, relata Carlos Lins.
A expectativa, segundo o diretor de Marketing do Santuário é levar para o Vaticano, em 2026, um presépio maior e com ainda mais identidade brasileira.
“A gente já tem um desafio. Conversamos com Tia Eva e com os irmãos dela: vamos fazer um grande presépio, como os presépios napolitanos, que são imensos e lindos. Vamos fazer um de fibras naturais, de repente o corcovado, Cristo, no ambiente do Brasil. Vai ser um desafio por causa da logística, mas é um desafio gostoso e compensador demais ver o olhinho das crianças brilhando e de todos aqueles turistas que passam e conseguem enxergar a identidade do nosso país. É incrível”, ressalta Lins, que considera a exposição uma missão evangelizadora, bem como de fomento ao artesanato local.
Esperança que vem do mar
A logomarca da exposição “100 presépios no Vaticano” foi representada pelas texturas de plásticos triturados após serem retirados do oceano e que se transformaram em arte.
Com as cores de verde e azul e as escritas “100 presépios no Vaticano” em amarelo, reunindo as cores do Brasil, o quadro do artista Marcos Martins ganhou espaço junto ao presépio e leva ao Vaticano o tema: “A Esperança que vem do mar”, que coaduna com o tema do Jubileu 2025: “Peregrinos de Esperança”.
Ele enriquece as peças em exposição não só pela promoção da identidade brasileira, mas também protagonizando as reflexões sobre o cuidado com a Casa Comum, aquela criada por Deus e cedida ao homem como uma dádiva, uma graça divina, para ser usufruída, mas com zelo e amor.
Marcos Martins lembra que em 2025, celebrou-se 10 anos da publicação da Encíclica Laudato Si’ e, neste ano, o Brasil sediou a COP-30 em que reuniu autoridades do mundo para discutir as questões climáticas e o cuidado com o planeta no coração da Amazônia: Belém.
“Eu fiquei muito emocionado ontem [8 de dezembro], em trazer algo simples, mas com uma beleza incrível, com técnica e com essa temática da ‘Esperança que vem do mar’, mas também a esperança que precisa vir das pessoas. As pessoas precisam ter essa consciência de cuidar do nosso planeta, da casa comum”, afirma Marcos Martins, que fala também sobre a expectativa para os próximos dias.
“Quero que, os brasileiros que estiverem aqui, conheçam a nossa exposição, visitem o nosso presépio, o nosso quadro, publiquem, divulguem, para as pessoas virem conhecer e saber da história da artesã, que é incrível, a história do Santuário Cristo Redentor a minha história também. Para que as pessoas possam ver que, por meio do material reciclado, a gente pode criar arte, fazer história”, explana Marcos Martins.
Ele lembra que a ideia de levar ao Vaticano um quadro feito com plásticos triturados partiu depois de uma iniciativa bem sucedida feita no Rio de Janeiro. O tapete de celebração da procissão de Corpus Christi na capital carioca, comumente confeccionado com sal grosso, em 2025 foi construído pelas mãos de Martins com plásticos retirados do mar e triturados.
“Foi um tapete lindo. Hoje ele é uma obra de arte, não foi descartado. Todo o plástico foi limpo, triturado e virou uma arte. Viraram quadros incríveis. Então, por que não trazer [a técnic] para o Vaticano para uma exposição internacional?”, pontuou ele.
O diretor de Marketing do Santuário Cristo Redentor, Carlos Lins, espera do público o encantamento em meio à simplicidade e a pureza do povo brasileiro que, segundo ele, mesmo diante das dificuldades, produz com singeleza e criatividade, a exemplo de Tia Eva e Marcos Martins, que transformam fibras e plásticos descartados no mar em arte.
“A gente espera que os turistas que passarem pela exposição possam se encantar com diversas obras incríveis do mundo todo, mas que eles percebam a simplicidade do nosso presépio e se encantem com a simplicidade do Brasil. Porque no fundo é isso: o brasileiro, na sua simplicidade, consegue conquistar o mundo todo.”
Para o reitor do Santuário Cristo Redentor, Padre Omar Raposo, o presépio é sustentável e foi criado com carinho para levar ao mundo a mensagem de que a espiritualidade nasce do cuidado. “Cuidado com o outro, com a criação, com a nossa Casa Comum. Que ele inspire muitos a acolher o menino Deus com um coração aberto e responsável”.
Artesanato como função social
A técnica da Família Gomes – empregada por Tia Eva – será difundida de forma gratuita para mulheres em situação de vulnerabilidade social por meio das Oficinas Criativas Casa Comum. A elas, serão ensinadas as técnicas tradicionais do artesanato em fibras naturais e reaproveitamento de materiais. A finalidade da iniciativa é de promover autonomia, com oportunidade de renda e valorização da cultura popular brasileira.
O projeto começará a ser executado em janeiro de 2026 na Obra Social Leste Um – O Sol, do Santuário Cristo Redentor, e será conduzida pela artesã Eva Gomes.
“A união entre as obras apresentadas no Vaticano e as ações sociais realizadas no Brasil reforça a missão do Consórcio Cristo Sustentável de promover a ecologia integral, desenvolvimento comunitário e preservação cultural”, pontuou o Santuário.
A exposição
A exposição internacional “100 Presépios no Vaticano”, foi inaugurada nessa segunda-feira, 8 de dezembro, entre os aplausos do público e o tradicional corte da fita por Dom Rino Fisichella, pró-prefeito do Dicastério para a Evangelização e responsável pela organização do Jubileu.
São exatamente 132 presépios expostos nesta oitava edição, provenientes de 23 países do mundo, entre eles muitos países europeus, como Itália, França, Croácia, Polônia, Hungria, Eslováquia, Eslovênia, Romênia e Suíça.
Muitas obras provêm também de outras partes do mundo, como Estados Unidos, Peru, Eritreia, Coreia, Venezuela, Taiwan, Brasil, Japão, Filipinas, Indonésia, Paraguai e Índia.
Fonte: Vatican News
