

FOLHAPRESS – Duas perguntas se impõem antes de falar de “Wicked: Parte 2”. A primeira é se fez sentido dividir em dois filmes a história das bruxas Elphaba e Glinda, que tanto no livro quanto na peça é contada em um fôlego só; a segunda é se esta sequência se trata de perda de tempo. A resposta é “não”.
Juntos, os dois filmes têm quatro horas e 58 minutos de duração, bem mais do que as duas horas e 45 minutos da peça. O enredo e as canções não aborrecem, mas seria fácil cortar excessos e repetições. Por vezes a narrativa se desvia das personagens centrais, sem contudo dar aos coadjuvantes uma história profunda o suficiente para justificar essa manobra.
O diretor Jon M. Chu parece tentar dar um filme a Elphaba, a bem-intencionada mas incompreendida Bruxa Má do Oeste do clássico “O Mágico de Oz”, e outro para Glinda, a bruxa boa que ajuda Dorothy e seus amigos a realizarem seus desejos. Na montagem teatral, a dicotomia é posta com mais sutileza, em acordo com a proposta antimaniqueísta da obra.
Portanto, se o primeiro filme era de Elphaba, papel de Cynthia Erivo, em uma interpretação memorável, este segundo fica para Glinda, interpretada por Ariana Grande, dona de um timing cômico surpreendente. Narrativamente, funciona. Mas porque Elphaba é, em geral, uma personagem mais interessante e nuançada do que Glinda, a sequência se empalidece diante do capítulo inicial.
A história é retomada do ponto em que as duas amigas, diante da descoberta de que o Mágico, vivido por Jeff Goldblum, é uma fraude, tomam caminhos distintos.
Elphaba, que com sua pele verde encara desde cedo o racismo, escolhe uma vida às margens de Oz, onde usa seus poderes para tentar ajudar os oprimidos pelos planos fascistas do governo -animais falantes e munchkins, um povo que lembra os duendes. Glinda, seduzida pela fama que Oz lhe oferece, prefere aproveitar tudo e tentar mudar a política por dentro, sem grandes rupturas.
São metáforas explícitas ao nosso tempo, e por isso o filme agradou a uma plateia maior do que os fãs de primeira hora da história e atraiu um público multietário.
É fácil enxergar no Mágico a figura de Donald Trump ou de outros políticos populistas que falam o que o povo quer ouvir e usam truques simples para desviar as atenções para pseudoinimigos, enquanto cerceiam vozes dissonantes e amealham poder. “Wicked”, com cores saturadas e trilha sonora pop, é uma história simples sobre fascismo e coragem.
Se na primeira parte Elphaba precisava aprender a usar seus poderes, nesta é Glinda quem precisa se convencer de que seu talento para liderar pode ser tão útil quanto a mágica da amiga. Se falássemos de geopolítica, Elphaba seria o “hard power”, o poder militar, e Glinda, o “soft power”, o poder da influência, ligado ao capital cultural. É preciso ter ambos.
“O Mágico de Oz” também foi lido como uma metáfora da política da virada do século 19 para o 20 -o livro é de 1900. Frank L. Baum, o autor, era visto como libertário ou mesmo anarquista, embora haja pouco consenso sobre seus alvos. Em geral, contudo, a interpretação é de que Dorothy representa o povo, ladeada pelos agricultores (o Espantalho) e pelos operários (o Homem de Lata), além das Forças Armadas (o Leão Covarde), todos combalidos na época. Há também simpatia a ideais feministas, o que dá força à sua heroína, e uma suposta crítica ao sistema monetário.
“Wicked” também é uma alegoria contra a opressão, e isso explica sua força entre grupos minorizados. A cena de deportação dos animais falantes, tal qual Trump tem feito com imigrantes, sublinha a ambição política do musical. A escalação de Erivo para o papel de Elphaba tornou mais evidente a questão racial, e a escolha das duas atrizes por dar uma luz gay à relação entre as amigas atualizou essa fábula moderna. Emoldurar tudo isso com canções inebriantes -embora desta vez tenha faltado algo epifânico como “Defying Gravity”- foi o caminho certeiro para cair no gosto popular.
Não há final feliz. As duas protagonistas se veem obrigadas a fazer escolhas que raramente são impostas aos homens. Sem “spoilers”, Elphaba, para viver em paz, deixa seus planos de carreira para trás; Glinda, para poder liderar, acaba solitária em sua missão. Algumas bruxas são de verdade.
WICKED: PARTE 2
– Avaliação Bom
– Quando Estréia nesta quinta-feira (19)
– Onde Nos cinemas
– Classificação 10 anos
– Elenco Ariana Grande, Cynthia Erivo, Jonathan Bailey
– Produção Estados Unidos, 2025
– Direção Jon M. Chu
Leia Também: Urias, Marina Sena, João Gomes e mais: Veja os indicados ao 32º Prêmio Multishow
Fonte: Notícias ao Minuto



