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O relatório Idos, apresentado em Roma, evidencia uma recuperação das emigrações depois do isolamento imposto pela covid-19. Migra-se sempre por motivos econômicos, mas também por questões legais e pelas mudanças climáticas. Para Luca Di Sciullo, presidente do Instituto de Pesquisas, a imagem dos migrantes na Itália ainda é caracterizada por muitos estereótipos
Alessandro Guarasci – Cidade do Vaticano
O mundo tem cada vez mais migrantes, sobretudo, por motivos econômicos. Segundo as estimativas da ONU, em 2024, havia 304 milhões de migrantes internacionais, o que equivale a 3,7% da população mundial e quase o dobro de 30 anos atrás. O principal destino é a Europa (com 100 milhões que procuram o continente), seguida da Ásia (85 milhões) e América do Norte (79 milhões). A Itália não é exceção. Depois da fase pandêmica e com a reabertura dos canais migratórios, a presença estrangeira continuou a crescer, chegando aos 5.422.426 residentes (+169 mil em un ano), o que corresponde a 9,2% da população total. Esses dados são do último relatório do Idos, apresentado hoje em Roma.
Crescem os migrantes econômicos, mas 10 milhões são por causas climáticas
Segundo o relatório, no Norte do globo, vivem 16,9% da população mundial, mas concentram 44% da riqueza. No Sul, está o restante: 83,1% da humanidade, com 15.800 dólares de renda média no ano, contra 62.800 dólares no Norte.
Essa fissura empurra milhões de pessoas a procurar dignidade e oportunidades em outro lugar. As remessas desempenham um papel compensatório importante: em 2024, chegaram a 685 bilhões de dólares aquelas enviadas para países de baixa e média renda (sendo 8,3 bilhões de euros provenientes da Itália)
Além disso, no final do ano, havia quase 10 milhões de pessoas deslocadas pelas mudanças climáticas, registradas separadamente e sem proteção oficial. Isso, apesar de uma decisão importante do Tribunal Internacional de Justiça da ONU, que reconheceu o princípio da não repulsão para aqueles que sofrem “impactos desproporcionados” da crise climática.
Recorde de rejeições e repatriações na Europa
Para o relatório, a “Europa vive um paradoxo: precisa de jovens e de mão-de-obra (até três quartos das empresas têm dificuldades para encontrar trabalhadores), mas pratica a rejeição, a terceirização e detenções nas fronteiras. Sofre com a influência do trumpismo americano, mas relembra seus métodos, institucionalizando a exclusão com menos clamor, mas com semelhante dureza.
Em 2024, houve 240. 021 travessias irregulares para a União Europeia, uma queda de 37,1% em relação a 2023, mas ainda quase o dobro dos níveis pré-pandemia. As rotas mais “movimentadas” ficam no Mediterrânio central (27,9%) e no oriental (29,1%), enquanto crescem os fluxos até às Ilhas Canárias e ao longo das fronteiras orientais com a Bielorrússia e a Rússia. Para Idos, nos primeiros seis meses de 2025, as travessias foram reduzidas a 75.867. A queda reflete mais a rigidez dos controles e aos acordos de contenção do que uma real dominuição das causas de fuga.
Quase um milhão de solicitações de proteção internacional na europa
A Europa continua, portanto, a ser um importante ponto de chegada. Em 2024, a UE recebeu 997.815 pedidos de proteção internacional, dos quais 83.425 se repetiram. Vale ressaltar que o número total de refugiados e requerentes de asilo residentes na UE ultrapassou 8,9 milhões, o que equivale a 2,0% da população da União.
Para Idos, no entanto, as 437.910 proteções concedidas (das quais 387.645 em primeira instância e 50.265 em recurso de apelo) escondem fortes desequilíbrios que colocam em discussão a equidade do Sistema Europeu Comum de Asilo (Ceas). Por exemplo, mais de 75% das solicitações se concentram em poucos países: Alemanha (250.615), Espanha (166.175), Itália (158.605) e França (157.945), enquanto países como Malta, Lituânia, Eslováquia e Hungria não registram nem menos de 1.000 cada.
Quanto à relação entre os refugiados/solicitantes de asilo e a população residente, destacam-se Chipre, com 7,5%; Alemanha, com 3,7%. República Tcheca, com 3,6%; e Áustria, com 3,4%.
As taxas de reconhecimento também são extremamente heterogêneas: vão de 95,7% da Estônia a 1,0% de Portugal, passando pela Itália (35,9%) e Alemanha (53,4%). De fato, o destino de uma solicitação depende também do país em que ela é apresentada. Segundo Idos, trata-se de uma verdadeira “loteria migratória”, onde o que conta é a geografia, além da legalidade.
Na Itália, 9,2% da população é migrante
Na Itália, a migração foi retomada após uma paralisação devido à covid. Os estrangeiros regularmente residentes são 5.422.426 (mais de 169 mil em um ano). Isso equivale a 9,2% da população total. Mantendo a tendência dos dois anos anteriores, cresceu o número de residentes vindos do exterior registrados oficialmente na Itália.
Dos 370 mil nascidos na Itália em 2024, dados que marcam o novo mínimo histórico do país, 13,5% são de filhos de pais estrangeiros, ou seja, pouco menos de 50 mil. Outros 7,8% de casal formado por italiano e estrangeiro. Todavia, também entre os estrangeiros, os nascimentos estão em queda, em linha com a taxa de natalidade geral, enquanto as aquisições de cidadania italiana permanecem elevadas (217.177, segundo os dados provisórios).
Os cidadãos de países não pertencentes à União Europeia que possuem permissão de residência aumentaram para 3.810.741 — um crescimento de 203.581 em relação a 2023.
A maioria vive na Itália há mais de cinco anos e possui uma autorização de residência por tempo indeterminado (52,8%). Entre as autorizações temporárias (47,2%), predominam os motivos familiares (37,0%), seguidos pelos motivos de trabalho (27,4%) e de proteção (26,9%) — destes, cerca de um terço por proteção temporária e um pouco menos por pedido de asilo.
Idos: Itália ainda valoriza pouco os migrantes
Para Luca di Sciullo, presidente da Idos, “a Europa está, cada vez mais, fechada em si mesma e tenta delegar a outros a gestão do fenômeno migratório, a exemplo da criação de um centro em Albania”.
Além disso, a maioria dos italianos vê “a imigração apenas através de caricaturas grotescas. São situações habilmente criadas por manipuladores astutos que, pelas nossas costas, exibem imagens de migrantes tão distorcidas e diferentes de nós. Dessa forma, eles se tornam alvos da raiva coletiva pelos males endêmicos e não resolvidos da Itália. Algumas axiomas: ‘nos roubam o trabalho’, ‘não pagam as taxas e vivem às nossas costas’, ‘trazem doenças e deliquências’. Apesar de terem sido refutadas há anos por fatos e números, essas ideias continuam a alimentar uma imigração imaginária, muito distante da realidade”. A triste conclusão é que, com muita frequência, os migrantes são explorados no mercado de trabalho, quando, na verdade, são essenciais para o funcionamento das empresas e das famílias.
Fonte: Vatican News
