
À medida que o mundo celebra o Ano Jubilar de 2025, líderes religiosos de toda a África do Sul uniram-se num forte apelo pelo cancelamento das dívidas e por uma reforma financeira global.
Sheila Pires – Joanesburgo, África do Sul
Na segunda-feira, 3 de novembro, uma delegação inter-religiosa, liderada pela Conferência Episcopal Católica da África Austral (SACBC), o Conselho Sul-Africano de Igrejas (SACC), a Comunhão Luterana da África Austral, a Fraternidade dos Conselhos Cristãos da África Austral (FOCCISA) e o Conselho Unido de Ulamas da África do Sul, apresentou uma petição aos líderes globais para que enfrentem a crescente crise da dívida que continua a sufocar as nações em desenvolvimento.
Vozes de fé em defesa da justiça económica
A petição — entregue ao Ministro das Relações Internacionais e Cooperação, Ronald Lamola, antes da presidência sul-africana do G20 — apela a uma ação global urgente para pôr fim ao que os líderes religiosos descrevem como uma injustiça moral e económica. O documento exorta o G20, G7, FMI, Banco Mundial e as Nações Unidas a cancelarem dívidas insustentáveis e criarem um sistema transparente e baseado em regras para evitar futuras crises.
“Dívidas públicas insustentáveis e injustas privam as nações dos recursos necessários para investir em saúde, educação e ação climática”, diz o texto. “Gerações inteiras estão presas em ciclos de pobreza e desigualdade. Países pobres gastam mais de 40% dos seus orçamentos no pagamento da dívida.”
Na sua carta jubilar Spes Non Confundit (“A esperança não decepciona”), o Papa Francisco recorda que a tradição jubilar é de libertação, renovação e restauração. Ele escreveu que a esperança deve “ser concedida aos bilhões de pobres que muitas vezes carecem do essencial para viver”. E acrescentou: “Se realmente desejamos preparar um caminho de paz, devemos comprometer-nos a remediar as causas remotas da injustiça, resolvendo dívidas injustas e impagáveis.”
A presidência do G20 e o impacto global
Ao receber a petição, o Ministro Lamola elogiou a iniciativa inter-religiosa, observando que ela está alinhada com as prioridades da África do Sul na presidência do G20.
“Recebemos o relatório do Jubileu de todas as organizações religiosas da África do Sul”, disse Lamola em entrevista a Vatican News. “Vamos processá-lo como parte das negociações da presidência sul-africana do G20 e da redação da declaração final para a cimeira em Joanesburgo, em novembro. As questões levantadas — alívio da dívida, transformação da arquitetura financeira global e desenvolvimento sustentável — respondem diretamente aos desafios enfrentados pelos países do Sul Global.”
Durante o encontro, o ministro confirmou que o relatório seria apresentado à presidência do G20 e ao Professor Joseph E. Stiglitz, que lidera a Comissão sobre Dívida Soberana do Vaticano e da Universidade de Columbia, uma nova iniciativa conjunta criada para propor reformas em prol do desenvolvimento global sustentável.
Um apelo à libertação e a novos começos
Falando aos microfones da Vatican News após a entrega, o Pe. Stan Muyebe, OP, Diretor da Comissão Justiça e Paz da SACBC, descreveu a petição como uma continuação da visão jubilar do Livro do Levítico.
“O Jubileu fala de perdão das dívidas e de liberdade para os que estão sobrecarregados por elas”, afirmou. “A nossa petição tem três exigências: cancelar as dívidas injustas, garantir um quadro permanente sob as Nações Unidas para evitar futuras crises da dívida e criar um sistema financeiro que priorize a dignidade humana acima do lucro.”
Por sua vez, a Irmã Dominica Mkhize, FSF, Secretária-Geral Adjunta da SACBC, descreveu o momento como “um passo crucial para o futuro da África”.
“Os pecados dos antepassados não devem ser transferidos para os filhos”, disse. “Precisamos de uma África liberta — capaz de investir no seu povo e no seu futuro.”
Um movimento global reacendido
A petição ecoa o espírito do movimento Jubileu 2000, que levou a um histórico perdão de dívidas, mas não reformou o sistema financeiro global. Hoje, diante das crises de desigualdade, mudança climática e endividamento insustentável, o chamado por um Jubileu da Terra ressurge com força.
Segundo o Banco Mundial, os países em desenvolvimento gastaram 1,4 trilhões de dólares com o pagamento de dívidas em 2023 — mais do que com saúde ou educação. A UNCTAD informa que 3,3 bilhões de pessoas vivem em países que gastam mais com dívidas do que com saúde, e 2,1 bilhões vivem em países que gastam mais com dívidas do que com educação.
A nova Comissão sobre Dívida Soberana do Vaticano e da Universidade de Columbia, presidida pelo laureado com o Nobel, Professor Joseph E. Stiglitz, visa corrigir essas injustiças propondo reformas que garantam que a dívida não comprometa o desenvolvimento humano nem o futuro do planeta.
A promessa do Jubileu: esperança por uma nova ordem económica
Como o Papa Francisco lembrou ao mundo, “Os bens da Terra não são destinados a uns poucos privilegiados, mas a todos.”
Para os líderes religiosos por trás da petição do Jubileu 2025, esta não é apenas uma questão económica — é um imperativo moral. O apelo ao cancelamento das dívidas injustas é um chamado à restauração da justiça, da dignidade e da esperança para bilhões de pessoas.
“O cancelamento da dívida”, afirmou o Pe. Muyebe, “não é caridade — é justiça há muito tempo devida.”
Fonte: Vatican News



