Carregando música...
Para ouvir nossa rádio, baixe o aplicativo RadiosNet para celulares e tablets com Android ou iPhone/iPads.

Ato relembra Herzog após 50 anos, e Alckmin evita debater anistia de 1979

Um ato em homenagem ao jornalista Vladimir Herzog na noite deste sábado (25) deixa a Catedral da Sé, em São Paulo, lotada e reúne familiares de vítimas da ditadura, religiosos, artistas e políticos, com discursos em defesa da democracia e dos direitos humanos.

A celebração recordou o assassinato de Herzog há exatos 50 anos pela ditadura militar e remeteu ao ato inter-religioso realizado à época, também na Sé, pelo arcebispo de São Paulo, dom Paulo Evaristo Arns, junto do rabino Henry Sobel e do pastor presbiteriano Jaime Wright.

Neste sábado, o trio foi representado pelo atual arcebispo de São Paulo, dom Odilo Scherer, pelo rabino Uri Lam, da Congregação Israelita Beth-El, e pela pastora Anita Wright, filha de Jamie Wright.


O vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB) compareceu representando o presidente Lula (PT), que tinha sido convidado pessoalmente por Ivo Herzog para o ato, mas cumpre no momento uma série de agendas na Malásia.

Questionado por jornalistas antes do início do evento sobre o que achava da revisão da Lei da Anistia de 1979, tema algo de cobrança da família de Herzog, o político evitou responder, dizendo apenas que “já demos bons passos nessa questão”.

Parte da sociedade civil e familiares de vítimas criticam a demora do STF (Supremo Tribunal Federal) em julgar ação parada desde 2014 na corte sobre o assunto. A lei aprovada ainda durante o regime autoritário concedeu perdão aos militares que cometeram crimes durante a ditadura.

Em declaração a jornalistas antes do evento, a presidente do STM (Superior Tribunal Militar), Maria Elizabeth Rocha, afirmou que a seu ver a Lei de Anistia de 1979 é inconstitucional.

“Eu sempre entendi que a lei de anistia era inconstitucional. Seja porque era incompatível com a nossa Carta política de 1988, e seja agora porque o Supremo entendeu que os tratados de direitos humanos têm caráter supralegal”, disse ela, apontando que crimes de lesa humanidade seriam sob a luz de tratados internacionais imprescritíveis e não sujeitos a qualquer tipo de perdão.

“Perdão que foi concedido, mas que não gera esquecimento. Por isso nós hoje estamos aqui. Porque se houve perdão, não houve esquecimento.”

Organizado pelo Instituto Vladimir Herzog e pela Comissão Arns, o ato teve início pouco depois das 19h, com uma apresentação do Coro Luther King. A maior parte do público presente trajava vestes brancas e carregava flores brancas, conforme havia sido sugerido pelos organizadores do evento.

Além de Alckmin, também compareceram o ministro Paulo Teixeira (Agricultura), o ex-ministro José Dirceu e deputados federais e estaduais.

Após a apresentação do coral, uma cerimonialista pediu um momento de silêncio em homenagem às vítimas da ditadura. Os presentes, então, levantaram cartazes com fotografias dos mortos e desaparecidos no período. Outros ergueram papéis com as frases “onde estão os nossos desaparecidos” e “a ditadura segue presente nas periferias”.

Na sequência, o coro começou a cantar “O Bêbado e o Equilibrista”, cuja letra, de João Bosco e Aldir Blanc, cita “choram Marias e Clarices” em referência a Clarice Herzog, mulher de Vlado, que lutou pelo reconhecimento de que o marido havia sido assassinado pelo Estado – e não que teria cometido suicídio.

No telão foram exibidas imagens de Vlado com a mulher e os filhos enquanto o público cantava junto do coral. A canção, interpretada lançada em 1979 na voz de Elis Regina, ficou conhecida como um dos hinos pela redemocratização.

O rabino Uri Lam foi convidado apenas dois dias antes da celebração. Inicialmente, o rabino Ruben Sternschein, da Congregação Israelita Paulista, faria a cerimônia, mas denúncias de que ele teria cometido assédio sexual contra fiéis, reveladas pela revista Piauí na quarta-feira (22), levaram a organização a trocar o celebrante.

Em outubro de 1975, cerca de 8.000 pessoas compareceram ao ato inter-religioso na Sé, que desafiou a ditadura militar por contestar a versão dada pelo regime de que Vlado, como era conhecido Herzog, havia cometido suicídio –ele foi torturado e morto na sede do DOI-Codi do Exército, em São Paulo, após ter se apresentado de forma espontânea para prestar esclarecimentos sobre sua militância pelo PCB (Partido Comunista Brasileiro).

Na ocasião, 800 agentes da repressão bloquearam as ruas que davam acesso ao centro da cidade, onde fica a catedral, e 500 monitoraram o entorno da igreja –dois agentes permaneceram no interior dela para documentar o evento.

Dom Paulo Evaristo Arns, Henry Sobel e Jamie Wright já eram críticos e atuantes contra a ditadura antes do assassinato de Vlado. O irmão de Wright, Paulo Stuart Wright, ex-deputado estadual de Santa Catarina, foi interrogado e morto no mesmo DOI-Codi em 1973. O corpo nunca foi localizado. O episódio o aproximou de dom Paulo, que já se posicionava contra a violenta repressão do regime.

“A dor da família Wright é não saber o que foi feito do corpo de tio Paulo e não poder dar um enterro digno a ele”, disse Anita Wright à Folha antes do ato.

Em 1985, o trio lançou o livro “Brasil: Nunca Mais”, que mapeia casos de mortes e torturas cometidas pela ditadura entre 1964 e 1979.


Veja mais em Folha de S. Paulo

Artigos relacionados

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Botão Voltar ao topo