
O centrão sofreu uma derrota ao final da votação que aprovou a PEC da Blindagem na Câmara dos Deputados nesta terça-feira (16). Com o quórum baixo após a meia-noite, uma modificação no texto, apoiada por deputados de esquerda e pelo Novo, acabou derrubando o dispositivo da proposta que estabelecia votação secreta.
O texto, chamado pelos deputados de PEC das prerrogativas, tem como objetivo dar ao Congresso o poder de barrar processos criminais no STF (Supremo Tribunal Federal) contra deputados e senadores ao exigir licença prévia do Legislativo. Essa autorização terá de ser deliberada pela respectiva Casa em até 90 dias a contar do recebimento da ordem do Supremo.
O texto original previa que essa votação fosse secreta, mas, quando esse ponto foi deliberado separadamente em plenário, acabou derrubado. Foram 296 votos a favor da votação secreta e 174 contrários, mas era necessária uma maioria de 308 deputados para manter o trecho.
Depois da derrota, o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), suspendeu a sessão para evitar novos reveses, adiando para quarta (17) a análise de mais dois destaques que poderiam alterar o texto.
Motta minimizou a derrota ao deixar o plenário, atribuindo a falta de votos ao quórum baixo dado o horário tarde da noite.
Com isso, a PEC ainda prevê a necessidade de aval do Congresso para investigação de parlamentares pelo STF, mas uma parte relevante do texto, que garantia o sigilo do voto, acabou retirada.
Em uma manobra para aprovação, o presidente da Câmara chegou a liberar a participação remota dos deputados, o que não é comum às terças-feiras.
A PEC da blindagem amplia o foro especial e protege parlamentares não só em relação a investigações criminais, mas abre também brecha na área cível, algo inédito.
Em relação ao texto principal, foram 353 votos a favor e 134 contrários, além de uma abstenção, no primeiro turno. No segundo turno, o placar foi de 344 a 133. Para aprovar uma PEC, é necessário o apoio de 308 dos 513 deputados federais.
Após a Câmara concluir a votação, a proposta segue para o Senado, onde precisa ser aprovada também em dois turnos para ser promulgada e entrar em vigor, não cabendo sanção ou veto presidencial.
A PEC teve o apoio da maioria dos partidos. Apenas PT, PSOL, PC do B, Rede e Novo votaram contra de forma unânime ou majoritária.
No primeiro turno, a Câmara tornou secreta a votação para autorizar a prisão de deputados federais e senadores. O PSOL pediu que esse trecho fosse excluído, para que a população saiba como cada congressista votou nesses casos, mas foi derrotado por 322 votos a 147.
Os deputados também aprovaram estender o foro especial para os presidentes de partidos políticos com representação no Congresso, mesmo que não tenham mandato parlamentar. Foram 317 votos a 156.
No segundo turno, esses dois trechos ainda serão analisados nos dois destaques adiados —ou seja, também podem acabar derrubados.
Patrocinado pelo centrão como reação às dezenas de investigações sobre desvio de emendas parlamentares no STF, o texto contém uma blindagem mais ampla do que a original estabelecida na Constituição de 1988 e que havia sido derrubada em 2001 devido à pressão popular contra a impunidade.
Os alvos do centrão, grupo de direita e centro-direita que tem maioria na Câmara, são as mais de 80 investigações no STF envolvendo suspeita de corrupção em verbas das emendas parlamentares, que movimentam a cada ano cerca de R$ 50 bilhões.
Além disso, deputados argumentam que a medida busca fortalecer o Parlamento diante do Poder Judiciário, alvo de reclamações por, por exemplo, derrubar leis aprovadas.
Hoje o foro especial de deputados e senadores diz respeito apenas a investigações e processos relativos a crimes cometidos no exercício do mandato e em função dele. Não há necessidade de autorização para o STF abrir processo e também não há foro especial na área cível.
A PEC diz que medidas cautelares contra congressistas só podem ser autorizadas pelo STF, o que abre a possibilidade de que mesmo atos tomados em ações de improbidade (cíveis) tenham que ter autorização da corte.
Presidente de partidos políticos também terão foro especial, ou seja, serão julgados pelo STF. A mudança beneficia dirigentes como o do PL, Valdemar da Costa Neto, e do União Brasil, Antonio Rueda.
Especialistas afirmam que caso seja aprovada definitivamente pela Câmara e Senado, a PEC sustará os processos em andamento assim que for promulgada, já que emendas constitucionais têm efeito imediato e não há regra de transição estabelecida na atual PEC.
Em 2022, o STF decidiu que o abrandamento na Lei de Improbidade feito pelo Congresso no ano anterior valia para os casos em andamento, não se aplicando apenas aos processos já julgados de forma definitiva.
Apesar desse precedente, a suspensão na prática será definida pelo próprio STF, que deverá ser provocado a se pronunciar sobre a aplicabilidade da emenda. A corte pode, inclusive, considerar inconstitucional a PEC, revogando sua eficácia.
O governo Lula (PT) liberou a bancada após um acordo com o centrão para aprovar a PEC em troca de apoio para barrar a proposta de ampla anistia aos condenados pela trama golpista, incluindo Jair Bolsonaro (PL).
No total, 12 deputados do PT votaram a favor e 51 contra. O líder de governo, Odair Cunha (PT-MG), votou a favor.
Por esse acordo articulado por Motta, a anistia ampla seria derrotada em votação nesta quarta-feira e haveria uma saída de meio-termo: a redução das penas dos envolvidos nos ataques golpista de 8 de Janeiro, incluindo a do ex-presidente e dos outros sete condenados pelo STF na semana passada.
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