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Análise: Defesas se desdobram para chamar a atenção do STF em processo decidido

O tom morno do primeiro dia do julgamento da trama golpista no STF foi condizente com um processo em que o principal já está mais do que decidido, a condenação de Jair Bolsonaro e boa parte de seus principais auxiliares.

Às defesas, coube a ingrata tarefa de tentar influenciar a decisão dos ministros ao menos marginalmente, e aí sobrou criatividade.

O ponto alto foi a performance, digna de um personagem de Chico Anysio, do ex-senador Demóstenes Torres, agora travestido de advogado do ex-comandante da Marinha Almir Garnier, com seus rapapés a todas as autoridades de que conseguia se lembrar, defesa do voto impresso e pregação radical da liberdade de expressão.

A defesa de Alexandre Ramagem, ex-diretor da Abin, buscou extirpar do processo a Abin paralela, enquanto a do ex-ministro da Justiça Anderson Torres usou slides de reservas de passagem para os EUA como álibis para provar falta de conexão com o 8 de Janeiro. É altamente improvável, para dizer o mínimo, que as estratégias tenham impressionado os togados que ouviam a argumentação com indisfarçável tédio.

A sensação de jogo jogado foi exponencializada com a ausência do procurador-geral da República, Paulo Gonet, da sessão vespertina, quando os advogados começaram a falar. Ele tinha mais o que fazer.

Usando apenas metade do tempo que tinha disponível, Gonet fez pela manhã um relato técnico e assertivo até onde sua personalidade discreta permite, mas pelo menos não abriu margem para acusações de ter sido tímido com os acusados, como ocorreu na fase de interrogatórios. A recondução antecipada a mais um mandato por Lula certamente funcionou como biotônico.

Neste clima geral de mansidão, apenas a ministra Cármen Lúcia destoou ao passar um pito no advogado de Ramagem, porque estaria, na visão dela, igualando auditoria do sistema de votação com voto impresso. Agiu por dever de ofício, como presidente do Tribunal Superior Eleitoral, mas pelo menos trouxe alguma eletricidade ao ambiente.

Ironicamente, a tarefa mais difícil talvez tenha sido a dos advogados do delator do esquema, Mauro Cid, que sofre com o cenário mais incerto entre os réus. Suas revelações cheias de idas e vindas, afinal, testaram a paciência do ministro Alexandre de Moraes e esgotaram a de Gonet, que abertamente fala em reduzir seus benefícios.

Os dois advogados que dividiram o tempo de defesa deixaram em segundo plano as revelações em si do tenente-coronel para embarcar em uma estratégia de apelo abertamente sentimental sobre por que o militar caído em desgraça merece ter sua colaboração reconhecida.

Pai exemplar, aluno brilhante, instrutor de artilharia, especialista em guerra irregular, oficial junto à ONU, a lista interminável foi coroada por uma revelação: sem condições psicológicas para seguir no Exército, pediu baixa da carreira à qual dedicou sua vida inteira.

Se os benefícios forem revogados, disse um dos advogados, Jair Pereira, acabou o instituto da delação premiada. “Ou ele vale ou não vale”, acrescentou.

O segundo dia de julgamento será a vez de alguns dos advogados mais experientes, que defendem os maiores peixes, Jair Bolsonaro e Braga Netto. É possível que isso gere debates jurídicos mais intensos e menos anedóticos, mas sempre dentro das quatro linhas fixadas por Alexandre, que todos a essa altura já conhecem bem.


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